quarta-feira, 13 de junho de 2012

TIVE UM SONHO, MELHOR, UM PESADELO

                                  Agenor Portelli Teixeira Magalhães


Transcorria o ano de 1470 e os inquisidores da Santa Sé, que tinham sido expulsos da Alemanha, encontraram terreno fértil em Portugal e na Espanha onde Fernando de Aragão e Isabel de Castela estenderam sua soberania, com as bênçãos do Vaticano.
Vi-me, de repente, participando do Tribunal da Inquisição do Santo Ofício julgando uma pessoa que a principio me pareceu Jesus, com sua barba atingindo o peito, os cabelos esvoaçando, olhar arrogante de quem se achava o melhor, orelhas de abano, nariz adunco e uma barriga protuberante.
Com o crucifixo à mão, Torquemada o acusava de organizar o caixa 2 na igreja em Espanha.
O acusado teimava em dizer que não sabia de nada, que não ouvira nada, e que nada fora provado.
Eu detestava o Torquemada, também não me simpatizava com o acusado, mas mesmo assim saí em sua defesa.
- Torquemada, não é justo condenar um cristão-novo que não sabe de nada!
Surpreso, Torquemada me encarou e me acusou de ter tentado salvar a bruxa de Rouen da fogueira (referia-se a Joana D’Arc). Voltou ao ataque:
- Ele se diz o Messias, trata-se de um herege.
Torquemada destilou seu fel.
-Nisso você tem razão, respondi.
-Ele diz ter construído um novo país, as terras de Vera Cruz.
-O acusado, com voz trôpega, conseguiu balbuciar: - vou chamá-lo de Brasil.
-Então vai para a fogueira por suas heresias, - agitou o crucifixo em direção ao cristão-novo, amarrado a um madeiro tendo aos pés uma pira.
Sentindo-me responsável em dar combustível para a fogueira de Torquemada, lancei um último repto:
-Torquemada, tens coragem de condenar à fogueira quem não sabe ao menos o que é heresia?- tentei apelar ao bom senso, coisa que o inquisidor-mor do Vaticano não tinha.
-Com os cenhos franzidos e olhar injetado de  ódio, Torquemada redargüiu:
-Estás a dizer que o herege é analfabeto?
-Sim, respondi timidamente.
-Em nome do Santo Oficio ordeno sua internação no convento até completar a alfabetização, - determinou Torquemada.
-Não, isso não, - implorou o condenado-, mil vezes a fogueira.
Torquemada voltou-se para o povaréu que queria ver carne assando na pira:
-Quem vocês preferem que queime no inferno: Mulla, o analfabeto, ou Bardoso, o arrogante?. E o povo em coro: Mulla, Mulla.
Sai em defesa da Mulla, isto é, do Mulla e gritei: mas Bardoso causou o desemprego de vocês e vendeu os bens do estado para continuar no poder!
E a massa: Mulla, Mulla.
Torquemada esfregou as mãos de satisfação e deu o veredicto final: - Crucifiquem-no!
No Gólgota, Mulla foi suspenso nas traves do madeiro entre dois ladrões.
Do lado direito, Valerius, o bom ladrão. Do lado esquerdo, Delubius, o mau ladrão.
Delubius, o mau ladrão, implora:
-Mestre, se tu és mesmo o Messias, livra-me dessa cruz, pois tudo o que roubei foi para eternizar o seu reinado.
Valerius, o bom ladrão, suplica:
-Mestre, tudo o que tomei emprestado foi porque acreditei em ti, lembra-se de mim quando entrares no teu reino.
Mulla, o falso Messias, dirigindo-se aos dois ladrões:
-Na verdade, na verdade vos digo: - “Hoje mesmo estarão comigo no inferno.”
Acordei suando, sentei-me na cama e tentei entender o sonho perturbador.
Telefonei para Daniel e contei o meu sonho para que ele me ajudasse a interpretá-lo. O profeta não me decepcionou: - “o povo até entende que um príncipe seja arrogante, mas um pobre analfabeto jamais pode faltar com seu compromisso. Maktub”.

Agosto/2006
(Premonição da derrota eleitoral do cabo Anselmo do PT).

Novembro/2006
Nota: Como sonhador e vidente não me sai bem.

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