sábado, 23 de junho de 2012

Escola: Ponto de Partida para um Crescer Permanente


Texto publicado no Jornal “Monitor Campista”, no dia 30/06 e 01/07 de 2001, mas atual e urgente, até os últimos dias.
Autora: Talita Tavares Batista Amaral de Souza, Pedagoga e Mestre em Sociologia, pelo IUPERJ; professora do ISEPAM (hoje aposentada) e UCAM/Campos.


A cada dia aumenta, entre nós, a convicção de que estamos, todos, envolvidos em uma sociedade, onde impera o crime organizado, a subversão, a violência generalizada, sob todas as formas. A mais grave constatação, porém, é a chamada violência branca, uma forma banalizada, corriqueira, cotidiana, muito mais sutil, passando despercebida, como se apenas resultasse da “ordem natural” das coisas. O perigo é que não a identificamos como resultado da ação humana internacional e pertencente a um jogo de interesse de um determinado grupo social.
Exemplo desse tipo de violência acontece quando assistimos, considerando como situações naturais, a cenas dramáticas nas ruas, nos noticiários ou em programas de TV, nas novelas, nas letras das músicas populares: quando testemunhamos, passivamente, o modo impróprio, desrespeitoso e criminoso com que se trata a natureza; quando cruzamos os braços diante dos altos índices de analfabetismo político, da exclusão social, da evasão escolar e da repetência nas escolas.
O convívio habitual e rotineiro, com várias formas de discriminação, com a marginalidade, autoritarismo e arbitrariedade, nos entorpece, tornando-nos insensíveis e indiferentes a essas aviltantes questões sociais e humanas. Vez por outra, porém, somos tomados por uma onda de entusiasmo e esperança. Poderemos encontrar uma saída, mesmo no breu em que nos encontramos? Acreditamos que só Deus, como Força-Maior, poderá guiar-nos, fortalecendo os elos entre a família e a escola, nesta busca de soluções, iluminando nossa caminhada.
Num gesto mais concreto, julgamos precisar buscar mais fôlego na claridade do passado, através de exemplos dignos e modelares, para suportarmos o presente e não perdermos, totalmente, a fé no futuro. É preciso lutar pela eternidade dos valores, universais, por sua grandeza em si mesma, enquanto essência da ação humana. Precisamos crescer! Crescer na nossa capacidade de amar, de respeitar e garantir o direito à cidadania plena para todos os cidadãos, especificamente para todas as pessoas pertencentes à nossa comunidade.
A busca de uma sociedade mais justa depende da implementação de mecanismos democráticos para o exercício do poder. A História de Educação do Brasil nos mostra que esse poder político sempre esteve a favor dos interesses de uma elite, desde os primeiros anos do domínio português. Nesse contexto social, a Educação escolarizada só era conveniente à camada dirigente. Sendo, naquela época, os jesuítas os únicos educadores de profissão, buscavam, desconsiderando a cultura indígena, catequizar e formar intelectualmente os índios, além de receberem subsídios pela educação de os filhos dos colonos portugueses, formando a elite colonial brasileira.
Mesmo após a expulsão da Companhia de Jesus de Portugal e do Brasil, em 1759, o sistema educacional brasileiro continuou articulado em torno da transmissão de conteúdos acríticos e pré-fixados, constituindo-se num instrumento de manutenção das estruturas sociais e políticas vigentes.
Somente após a Primeira Guerra Mundial, por volta de 1930, com novos sistemas, ideologias opostas e crises econômicas mundiais, com o crescimento da população brasileira, a diversidade de classe, as quais adquiriram consciência de seus limites, surge o jogo antagônico de forças políticas educacionais conservadoras (a favor dos interesses de uma elite) e modernizadoras (voltadas para a questão da extensão na Educação Pública), notando-se, marcadamente, o predomínio daquelas.
Entendemos que o poder público deve resguardar a dívida histórica, possibilitando a todos os estudantes, o usufruto, no presente, de um padrão de cidadania, com Educação Escolar de qualidade, em todos os graus, vista como uma referência, um dever do Estado, direito de todos os cidadãos, não apenas como um privilégio de alguns. É preciso resgatar essa dívida social, em função do regime escravocrata vigente no país até 1888 e dos regimes socialmente excludentes que o seguiram. É mister, no entanto, estarmos preparados para reivindicar, com segurança e firmeza, no sentido de responder a esse desafio que se nos apresenta: democratizar a Educação, sem dúvida, porém sem abrir mãos de sua qualidade.
Somente procurando estudar a realidade social vivida, de modo científico, a forma de organização de nossa sociedade e as relações sociais nela inseridas, analisar os meios e os fins a que nos propomos com a nossa prática educativa, teremos condições de denunciar as distorções do processo educacional, traçar o diagnóstico, para buscarmos a realidade desejável, com que tanto sonhamos.
Faz-se necessário e urgente repensarmos nossa ação pedagógica inserida no contexto social, histórico e político, tomarmos posições, de maneira consciente, para que, juntos – alunos, professores, pais, enfim, toda a comunidade, em geral, se permita buscar  e acreditar na conquista deste ideal: um mundo mais humanizado e solidário.
Concluindo essa reflexão, podemos ratificar o pensamento de Bertold Brecht, pois acreditamos, como ele, que: “Quando a gente sonha, tem apenas um sonho. Mas, quando muitos sonham, a realidade acontece”.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

O QUE FOI FEITO DO ROMANTISMO?


AUTORIA DE JOSÉ GURGEL DOS SANTOS, retirado do paineldo gurgel.blogspot.com

Quem tem mais idade lembrará, certamente, dos versos doridos de Noel Rosa que, em época junina como a que estamos vivendo agora, assim escreveu: “Nosso amor que eu não esqueço/ e que teve o seu começo/ numa festa de São João/ morre hoje sem foguete/ sem retrato, sem bilhete/ sem luar e sem violão/...” Havia nos versos da canção vários ingredientes de um romantismo, um lirismo cheio de paz onde os jovens buscavam os seus relacionamentos e que perdurou por muito tempo no cancioneiro popular brasileiro...
Vinícius de Moraes, diplomata que, para o bem da nossa MPB, deixou a carreira da diplomacia para unir-se a parceiros como Tom Jobim, Carlos Lira, Baden Powell, Edu Lobo, entre outros, nos deixou verdadeiras pérolas que embalaram outros casais igualmente românticos, apaixonados, que procurando conhecer melhor a pessoa amada, muitas vezes, buscavam inspiração e apoio nos versos cheios de sentimento do nosso grande poeta romântico... um dos clássico dele com Carlos Lira uniu muitos casais enamorados da época: “Se você quer ser minha namorada/ ah, que linda namorada você poderia ser/...”
Roberto e Erasmo Carlos parecem ser os últimos da nossa música a inspirar corações enamorados com letras como: “Eu tenho tanto pra lhe falar/ mas, com palavras não sei dizer/ Como é grande o meu amor por você/...” quantos casais não trocaram alianças e juras de amor eterno ao som desse lindo poema musicado pela dupla...
Está certo que já não há mais clima para serenatas ao luar. Mas, o amor não costuma sair de moda. A não ser da maneira como ele está sendo tratado ultimamente, onde os jovens saem como abelhas buscando o mel em qualquer flor que encontre, competindo em festas alucinantes para ver quem beijou mais, quem “ficou mais”...O triste é a gente não encontrar mais amor nos modernos relacionamentos, que são embalados por “pérolas” como: “Vou te levar, na minha humilde residência/ Mas, por favor, tenha um pouco de paciência/ a cama tá quebrada e não tem cobertor”... ou esta outra: “Ex-my love, ex-my love,/ se botar seu amor na vitrine/ ele nem vai valer R$ 1,99”.
Não. Não é apenas o ex-amor do compositor de um dos maiores sucessos da nova MPB que não está valendo nada. No contexto atual, infelizmente, é o próprio AMOR que já não vale mais nada...

sábado, 16 de junho de 2012

Ao Livro Verde, a livraria mais antiga do Brasil


 O Monitor Campista, edição 419, 2/7/1844

                              Contribuição de Eusébio Galvão

Corria o mês de junho de 1844, há  168 anos, numa quinta-feira, dia 13 daquele mês, que a livraria Ao Livro Verde abria suas portas na então rua da Quitanda, nº 22, na cidade  de Campos. O empreendimento foi inaugurado pelo português José Vaz Correia Coimbra. “Havia na época um porto importante na região – o Cais do Imperador na foz do no rio Paraíba do Sul –, que trouxe muitas famílias portuguesas para cá”, explica Ronaldo Sobral, atual proprietário da loja. “Graças a isso, havia uma demanda por livros importados de Portugal”.

Cento e sessenta e oito anos depois, o cais não existe mais, as famílias portuguesas se tupinicanizaram e o Brasil já produz seus próprios livros, mas a livraria Ao Livro Verde continua de portas abertas na rua Governador Teotônio Ferreira de Araújo, nº 66. Mudou de endereço, pensariam os mais incautos. Mas não – foi a rua que mudou de nome e de numeração. A livraria segue onde sempre esteve e é a mais antiga livraria do Brasil em funcionamento. Na Livro Verda tem uma variada exposição de livros de autores campistas e que falam sobre Campos.. E Ronaldo é gente muito boa, atendendewndo à todos com muita atenção.
É bem verdade que possui uma grande área dedicada a produtos de papelaria e oferece uma gama de produtos bastante variada e nem sempre diretamente ligada ao livro. Mas a realidade é que a Ao Livro Verde já nascera assim e, em tempos de desafios para as livrarias independentes, parece encontrar em suas origens uma forma de sobreviver. Como o jornal O Monitor Campista noticiou na época da abertura da loja, o estabelecimento oferecia, além de livros, “...perfumarias, miudezas, livros pautados e em branco, um lindo sortimento de jóias do último gosto, drogas medicinais e para pintura...”, além de comercializar, como não podia deixar de ser, “o verdadeiro rapé Bernardes”, que supria, nos idos de 1844, a falta do similar Princesa de Lisboa.

Mas Ronaldo Sobral, cuja família é proprietária da livraria há 80 anos, não olha apenas para o passado. “Nossa loja virtual sai ainda este ano no ar”, explica o livreiro, ao lado do cyber café que já existe na loja física e de olho no futuro. Até já existe algum movimento no
www.aolivroverde.com.br, embora o catálogo ainda não esteja no ar. Mas o que importa é que lá no alto da página já estão publicadas, com muito orgulho, as palavras “Desde 1844”.

Abaixo republicamos a íntegra da notícia sobre a abertura da livraria Ao Livro Verde publicada em O Monitor Campista. Mantivemos a grafia da época:

“Loja do livro verde, rua da Quitanda n. 22
José Vaz Correia Coimbra e C.ª, annuncião ao respeitável publico que acabão de abrir sua casa de negocio, com a denominação acima especificada, na qual se acha para vender o seguinte: um variado sortimento de obras e mais pertences para escolas de instrucção primariae secundaria de latim e francez, bem como novellas, historias e romances; musica de cantoria e para pianno, e vários instrumentos de corda e sopro; papel almço e de peso de differentes qualidades, dito de Hollanda, e outros accessorios para escriptorio; perfumarias, miudesas, livros pautados e em branco, um lindo sortimento de jóias do ultimo gosto, drogas medicianaes e para pintura, broxas e papelão de números sortidos, o verdadeiro rapé Bernardes, que já supre a falta do princesa de Lisboa, excellente chá hisson, bem como outros muitos artigos que se hão de annunciar. Os annunciantes se propõem a servir e por preços razoáveis, as pessoas que queirão honrar com sua confiança.”

 

quarta-feira, 13 de junho de 2012

TIVE UM SONHO, MELHOR, UM PESADELO

                                  Agenor Portelli Teixeira Magalhães


Transcorria o ano de 1470 e os inquisidores da Santa Sé, que tinham sido expulsos da Alemanha, encontraram terreno fértil em Portugal e na Espanha onde Fernando de Aragão e Isabel de Castela estenderam sua soberania, com as bênçãos do Vaticano.
Vi-me, de repente, participando do Tribunal da Inquisição do Santo Ofício julgando uma pessoa que a principio me pareceu Jesus, com sua barba atingindo o peito, os cabelos esvoaçando, olhar arrogante de quem se achava o melhor, orelhas de abano, nariz adunco e uma barriga protuberante.
Com o crucifixo à mão, Torquemada o acusava de organizar o caixa 2 na igreja em Espanha.
O acusado teimava em dizer que não sabia de nada, que não ouvira nada, e que nada fora provado.
Eu detestava o Torquemada, também não me simpatizava com o acusado, mas mesmo assim saí em sua defesa.
- Torquemada, não é justo condenar um cristão-novo que não sabe de nada!
Surpreso, Torquemada me encarou e me acusou de ter tentado salvar a bruxa de Rouen da fogueira (referia-se a Joana D’Arc). Voltou ao ataque:
- Ele se diz o Messias, trata-se de um herege.
Torquemada destilou seu fel.
-Nisso você tem razão, respondi.
-Ele diz ter construído um novo país, as terras de Vera Cruz.
-O acusado, com voz trôpega, conseguiu balbuciar: - vou chamá-lo de Brasil.
-Então vai para a fogueira por suas heresias, - agitou o crucifixo em direção ao cristão-novo, amarrado a um madeiro tendo aos pés uma pira.
Sentindo-me responsável em dar combustível para a fogueira de Torquemada, lancei um último repto:
-Torquemada, tens coragem de condenar à fogueira quem não sabe ao menos o que é heresia?- tentei apelar ao bom senso, coisa que o inquisidor-mor do Vaticano não tinha.
-Com os cenhos franzidos e olhar injetado de  ódio, Torquemada redargüiu:
-Estás a dizer que o herege é analfabeto?
-Sim, respondi timidamente.
-Em nome do Santo Oficio ordeno sua internação no convento até completar a alfabetização, - determinou Torquemada.
-Não, isso não, - implorou o condenado-, mil vezes a fogueira.
Torquemada voltou-se para o povaréu que queria ver carne assando na pira:
-Quem vocês preferem que queime no inferno: Mulla, o analfabeto, ou Bardoso, o arrogante?. E o povo em coro: Mulla, Mulla.
Sai em defesa da Mulla, isto é, do Mulla e gritei: mas Bardoso causou o desemprego de vocês e vendeu os bens do estado para continuar no poder!
E a massa: Mulla, Mulla.
Torquemada esfregou as mãos de satisfação e deu o veredicto final: - Crucifiquem-no!
No Gólgota, Mulla foi suspenso nas traves do madeiro entre dois ladrões.
Do lado direito, Valerius, o bom ladrão. Do lado esquerdo, Delubius, o mau ladrão.
Delubius, o mau ladrão, implora:
-Mestre, se tu és mesmo o Messias, livra-me dessa cruz, pois tudo o que roubei foi para eternizar o seu reinado.
Valerius, o bom ladrão, suplica:
-Mestre, tudo o que tomei emprestado foi porque acreditei em ti, lembra-se de mim quando entrares no teu reino.
Mulla, o falso Messias, dirigindo-se aos dois ladrões:
-Na verdade, na verdade vos digo: - “Hoje mesmo estarão comigo no inferno.”
Acordei suando, sentei-me na cama e tentei entender o sonho perturbador.
Telefonei para Daniel e contei o meu sonho para que ele me ajudasse a interpretá-lo. O profeta não me decepcionou: - “o povo até entende que um príncipe seja arrogante, mas um pobre analfabeto jamais pode faltar com seu compromisso. Maktub”.

Agosto/2006
(Premonição da derrota eleitoral do cabo Anselmo do PT).

Novembro/2006
Nota: Como sonhador e vidente não me sai bem.

terça-feira, 12 de junho de 2012

Arroz de Palma

Trecho do livro de autoria de Francisco Azevedo. 
Contribuição de Sérgio Armando

"Família é prato difícil de preparar. São muitos ingredientes. Reunir todos é um problema...Não é para qualquer um. Os truques, os segredos, o imprevisível. Às vezes, dá até vontade de desistir...Mas a vida... sempre arruma um jeito de nos entusiasmar e abrir o apetite. O tempo põe a mesa, determina o número de cadeiras e os lugares. Súbito, feito milagre, a família está servida. Fulana sai a mais inteligente de todas. Beltrano veio no ponto, é o mais brincalhão e comunicativo, unanimidade. Sicrano, quem diria? Solou, endureceu, murchou antes do tempo. Este é o mais gordo, generoso, farto, abundante. Aquele, o que surpreendeu e foi morar longe. Ela, a mais apaixonada. A outra, a mais consistente...Já estão aí? Todos? Ótimo. Agora, ponha o avental, pegue a tábua, a faca mais afiada e tome alguns cuidados. Logo, logo, você também estará cheirando a alho e cebola. Não se envergonhe de chorar. Família é prato que emociona. E a gente chora mesmo. De alegria, de raiva ou de tristeza. Primeiro cuidado: temperos exóticos alteram o sabor do parentesco. Mas, se misturadas com delicadeza, estas especiarias, que quase sempre vêm da África e do Oriente e nos parecem estranhas ao paladar tornam a família muito mais colorida, interessante e saborosa. Atenção também com os pesos e as medidas. Uma pitada a mais disso ou daquilo e, pronto: é um verdadeiro desastre. Família é prato extremamente sensível. Tudo tem de ser muito bem pesado, muito bem medido. Outra coisa: é preciso ter boa mão, ser profissional. Principalmente na hora que se decide meter a colher. Saber meter a colher é verdadeira arte. Uma grande amiga minha desandou a receita de toda a família, só porque meteu a colher na hora errada. O pior é que ainda tem gente que acredita na receita da família perfeita. Bobagem. Tudo ilusão. Não existe Família à Oswaldo Aranha; Família à Rossini, Família à Belle Manière; Família ao Molho Pardo (em que o sangue é fundamental para o preparo da iguaria). Família é afinidade, é à Moda da Casa. E cada casa gosta de preparar a família a seu jeito. Há famílias doces. Outras, meio amargas. Outras apimentadíssimas. Há também as que não têm gosto de nada, seria assim um tipo de Família Dieta, que você suporta só para manter a linha. Seja como for, família é prato que deve ser servido sempre quente, quentíssimo. Uma família fria é insuportável, impossível de se engolir.
Enfim, receita de família não se copia, se inventa. A gente vai aprendendo aos poucos, improvisando e transmitindo o que sabe no dia a dia. A gente cata um registro ali, de alguém que sabe e conta, e outro aqui, que ficou no pedaço de papel. Muita coisa se perde na lembrança. Principalmente na cabeça de um velho já meio caduco como eu. O que este veterano cozinheiro pode dizer é que, por mais sem graça, por pior que seja o paladar, família é prato que você tem que experimentar e comer. Se puder saborear, saboreie. Não ligue para etiquetas. Passe o pão naquele molhinho que ficou na porcelana, na louça, no alumínio ou no barro.
Aproveite ao máximo. Família é prato que, quando se acaba, nunca mais se repete."

sexta-feira, 8 de junho de 2012

ANJO DA MARQUISE




              Autoria: Agenor Portelli Teixeira Magalhães


0ntem recebi a visita do Cláudio e Irene, nossos melhores amigos. Como todos sabem, fiquei anti-social há um bom tempo e o casal é um dos raros que nos honra com sua visita.
Eles estavam chegando de Paris onde deixaram um rastro de destruição sem precedentes, só visto na tomada da Bastilha. Anteriormente, eles estiveram na Ásia e saíram a tempo de se livrarem do tsunami.
Mostraram as fotografias de Paris, os locais por onde andaram e depois começamos a falar da corrupção. Eta “assuntozinho” inevitável em qualquer roda. Eu e o meu amigo combinamos que não devemos discutir futebol (ele é Flamengo e eu Vasco), nem religião (ele é católico praticante e eu sou livre-pensador), e na política ele votou no Ciro e eu no Garotinho. Em comum nossa repulsa a Lula e sua equipe da fuzarca.
O amigo me procurou para saber o que íamos fazer depois de aposentados. Ele é auditor da receita federal e viaja todo ano para o exterior enquanto o lugar mais longe que alcancei foi uma pousada na Estrada Teresópolis-Friburgo.  Ele propôs, quando aposentarmos, comprar um terreno em Camboinhas e construirmos um bloco de apartamentos. Chamaríamos outros conhecidos para a empreitada. Ponderei que o aforamento e laudêmio na região iría atrapalhar as vendas. Concordou e propôs fazermos então uma pousada. Achei boa idéia, mas discordei quando propôs que vendêssemos depois de posta em funcionamento. Fizemos as contas e achamos que iríamos ficar ricos, isso depois de velhos. Na hora de distribuirmos a receita começou as desavenças, ele achava que devíamos reinvestir em outro negocio e eu achava que devíamos parar por ali, pois a idade avançada não recomendava novas investidas em um ramo com riscos, ainda mais com essa desconfiança do mercado sobre o efeito Lula-Palocci. Não houve consenso e como nossa amizade já tem 50 anos desistimos de ficar ricos.
À noite não consegui conciliar o sono. Achei que tinha exagerado nas criticas aos projetos do meu amigo e fiquei a pensar se não o teria ferido de alguma forma. Havia esquecido a lição de Yancey. Depois de rolar a cabeça no travesseiro por vezes sem fim sentei na cama sobressaltado.
O que me incomodava o sono não eram as divergências com o meu amigo, pois me lembrei que durante a manhã, no trabalho, uma colega me pedira para ajudá-la a resolver um problema muito sério na sua rua. Começou apelando aos meus brios de cidadão:
- “O senhor que é entendido em laudêmio, pode me ajudar a resolver o problema dos mendigos da minha rua. Eles ficam na calçada do Banco Itaú ocupando todo o espaço, brigam, discutem, fazem sexo e necessidades fisiológicas ali mesmo, sem que o poder público resolva esse grave problema social”.

Ultimamente ela me ouvia falar muito ao telefone sobre laudêmio e concluiu que problemas sócio-econômicos eram comigo mesmo. Na verdade eu já tinha tido uma boa experiência com mendigos. No bairro do Vital Brasil, onde resido, os mendigos ocupavam a praça, faziam algazarra, impedindo que as crianças usufruíssem equipamentos de lazer. Moradores me procuraram para se queixar, pois os mendigos dormiam nos bancos e ali mantinham relações sexuais.
Aceitei a incumbência dos moradores e tomei atitude. Cheguei lá na praça e com autoridade dei um ultimato: - vocês tem meia-hora para juntar suas tralhas e sumirem do bairro. Vão para a Praça de Icaraí, do Ingá, campo de São Bento, o raio que os parta, mas aqui não quero vê-los mais. Não contestaram e fui embora. À noite, retornando do trabalho, saltei do ônibus na parada da praça e fui verificar o resultado. Não havia mais nenhum mendigo.  E assim foram os dias que se sucederam até que numa caminhada que fiz pelo bairro ouvi vozes embaixo da ponte do canal. Fui verificar, pensando que eram operários da prefeitura fazendo a limpeza do canal, e encontrei os cinco mendigos morando embaixo da ponte. E ainda me acenaram com as mãos.

Com essa experiência, e lembrando que antigamente mendigos foram jogados no rio da Guarda, respondi à colega:
-“Não tem jeito para mendigo, ninguém consegue resolver esse problema. Agora estão botando fogo em mendigo”.

Uma centelha fez-me sentar na cama, e me questionei se àquela hora alguém não estaria prestes a tocar fogo nos mendigos mencionados pela colega.
Sem que Heloisa percebesse, levantei-me, vesti-me rapidamente, peguei o carro e toquei para a Rua Gavião Peixoto. Eram cerca de 2 horas da manhã.
Estavam todos lá, os mendigos do Banco Itaú. Apesar do calor sufocante, eles estavam envoltos em trapos esfarrapados e mal cheirosos. Fiquei a pensar por que eles sempre escolhem as marquises dos Bancos. Observei que na calçada do Unibanco, do Bradesco, da Caixa Econômica estavam mais moradores de rua dormindo. Por que os gerentes dos bancos não os expulsavam? Seria uma forma de se redimirem dos seus altos lucros propiciados pela política daquele a quem chamo de cabo Anselmo do PT?
Fiquei ali de plantão, para não deixar que nada acontecesse àquele bando. O cheiro era ruim, causado pelo suor gorduroso oxidado de pele macilenta e pela urina que empestavam o ar. Pisei em alguma coisa pastosa e exalou um cheiro insuportável. Quanto mais limpava a sola do sapato na quina do meio-fio mais fedia. Nada fede tanto quanto merda de mendigo. Arreh. Soltei um palavrão.
De repente, um mendigo acordou e me viu. Olhando-me desconfiado, cutucou o companheiro do lado que também ergueu a cabeça e, após alguns segundos, perguntou:
- O que você quer?
-Sem saber o que responder, disse:
-Sou o Anjo da Marquise.
Mais alguns instantes de silencio e pareceu-me que ficaram tranqüilos e recostaram as cabeças um no outro e entraram num sono profundo dos justos.
Já eram cinco horas da manhã e o dia começava a clarear. Assim que a visibilidade ficou patente, achei que a minha vigília poderia ser suspensa. Cheguei em casa e fui direto para o computador escrever, com uma idéia fixa: Anjo da Marquise. De onde meu subconsciente havia tirado aquilo? Afinal quem são os anjos da marquise? Onde eu teria ouvido isso?
Acordei suando, meio aterrorizado com aquele sonho sobre moradores de rua. Vesti-me rápido. Peguei o carro e cheguei em Icaraí.  Infelizmente não tive tempo de evitar que Leandro da Silva Águas, de 21 anos, fosse incendiado por outros moradores de rua em briga por espaço para dormir.

Junho/2008

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Leituras


TEXTO DO PROFESSOR SÉRGIO ARMANDO

Segundo a professora Arlete Sendra “Com palavras que nomeiam pedras, flores e  pão, o  poeta escreve  em  partituras polifônicas e persistentes  veiculação  da  energia  do  pensamento. E, em sons e tons que modulam  a sensação criadora, desvela, em estado de lin-guagem, e entre códigos  verbais, as labirínticas  formas  de vida e denuncia a iminência de um tempo inumano”.

               Mestra em Literatura Brasileira, Doutora em literatura
               de  Língua  Portuguesa, Pós-doutorada  em  semiótica e
               membro da Academia Campista de Letras.

Pegando  uma  caroninha  com essas  supimpas  palavras  acima, montei uma tabela  em que a soma dos quatro números,  separa-damente, nas  horizontais, nas  verticais, nos  extremos, no meio,
nas diagonais e em outras direções, resulta um único “valor”.
Esse valor, corresponde  ao tempo (em ano) que  muitas crianças não conseguem atingir, por falta de nutrientes vitais nas suas ali-mentações diárias.
Essa  tabela  é educativa para alunos  e para denunciar uma  das falhas governamentais , com as  palavras que escrevi  acima.

                    (-0,125)      0,1875      0,125       0,8125
                     0,3125        0,625    (-0,4375)        0,5
                     0,5625        0,375       0,4375    (-0,375)
                       0,25        (-0,1875)   0,875       0,0625