sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Primeiro sinal da crise




Texto escrito por Áurea Magalhães de Sousa

Do aeroporto ao Hotel Roma em Lisboa, fomos conduzidos por um funcionário da Lusanova que nos recebeu dando as boas vindas em Portugal. Rapaz educado, atencioso, muito gentil e com o português bem entendido por nós. Sentimos que estávamos em casa. Durante o percurso ele mostrou-se amável e já adiantava algumas informações, inclusive que um guia estaria nos  esperando na porta do  hotel.
O grupo ainda estava se formando no hotel, quando eu, Vera, o casal Floripa e as cariocas resolvemos nos adiantar fazendo um tour pela cidade com outra empresa.
Fomos recebidos por um português, que falava rapidamente, com voz grossa e de difícil compreensão. Um brasileiro, educadamente, pediu para ele falar mais devagar. Mas a resposta foi grosseira: _ Vocês não sabem falar português. 
Todos ficaram assustados com a reação daquele senhor. Pensei que seria muito fácil para comunicarmos na mesma língua, mas nem sempre foi assim. Achei a nossa maneira de falar mais alegre, tranquila, sonora e compreensível. 
O português continuou resmungando alguma coisa e mal humorado deixou a entender que não gostava mesmo de se comunicar com os brasileiros.
Outro brasileiro se desculpou e pediu para ele repetir o que havia falado. Exaltado, ele nos surpreendeu com a resposta: _ Já falei e não vou repetir.
Não queríamos acreditar no que ouvimos e começamos a sentir que estávamos sendo desprestigiados. E perguntei para Vera:_Qual língua falamos?
Vera sem pestanejar e com muita personalidade falou alto e em bom tom para todos que quisessem ouvir: _ Falamos a língua brasileira!
Fiquei a pensar como bagunçamos a nossa língua, a ponto de não entendermos os nossos irmãos portugueses. Uma brasileira sentindo-se ofendida deu o troco para aquele senhor: _ Aprendemos a falar o português com vocês. Nosso professor foram os portugueses presidiários, sem instrução,  que  mandaram para colonizar a nossa terra.
Outra conterrânea também contagiada pelas emoções, acrescentou: _Levaram  o nosso ouro e a nossa madeira.                       
_ E o seu rei, que fugiu de Napoleão e foi se refugiar no Brasil!...
Uma carioca completou: _ Quer pior exemplo que Dom. Pedro l?
E assim os nossos companheiros rebatiam os argumentos daquele senhor. Mas quando ele ouviu falar em D. Pedro l, deu a sua investida rancorosa e nos provocando falou: _ Vocês não sabem nada, tudo errado. Ele nunca foi Pedro l, ele é Pedro lV.
Foi aí que Vera, procurando acalmar os ânimos e como pedagoga deu a sua aula: _ Senhor, o Brasil era uma monarquia e D. Pedro l foi o nosso primeiro príncipe, se ele era o primeiro não podemos chamar de quarto. E a língua brasileira é o resultado de uma miscigenação. Nós tivemos influência na cor, gastronomia, música, religião, costumes, de muitos povos que formaram o nosso país.
O português mal humorado ainda quis superar com os seus argumentos: _ Nós somos raça pura.
Nessa hora, Vera subiu nas tamancas: _ Pelo amor de Deus, não me venha com essa! Foi com a paranoia de “raça pura” que os nazistas produziram o terrível holocausto. O senhor se esquece de que os árabes já dominaram a Península Ibérica e deixaram, felizmente, grande marca na cultura portuguesa.
                 Eu já estava tirando Vera daquele bate-boca inflamado, quando resolvi colocar um ponto final naquele blá-blá: _ Senhor, quando tudo se mistura, tudo se completa.
Um funcionário do hotel que a tudo assistia não agradou da atitude do guia, ligou para a Lusanova e pediu de imediato a troca do funcionário. A nova guia não demorou muito a chegar, se desculpou e falou que a crise em Portugal estava deixando alguns portugueses com os ânimos exaltados.
Fizemos amizade com muitos portugueses que atravessaram os nossos caminhos, mas os mais exaltados, com o jeitinho brasileiro, nós fomos conquistando.
Fechamos a nossa excursão com chave de ouro com a nossa última guia, a portuguesinha Joana. Moça bonita, alegre, atenciosa, delicada, com bons conhecimentos e falando a nossa língua “brasileira”. Não me esqueci de suas primeiras palavras ao entrar no ônibus: _ Meu nome é Joana, especializada em guia de brasileiros. Vou seguir com vocês para a Espanha. Com muito carisma ela conquistou não só os nossos corações, mas também  dos colombianos, mexicanos, chilenos, argentinos e até de CORINTIANOS, como o nosso paulista Manoel, que extravasou a sua alegria cantando o hino do seu timão: _ Salve o Coríntians, o  maior dos campeões...
                Realmente, Joana fez a diferença. Com a sua simpatia, com o nosso sotaque e dona de uma voz melodiosa, se integrou com todo o grupo aproximando-nos mais e dali para frente tudo foi festa.



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